Couro sintético: tão bom quanto o natural
O couro artificial já traz vantagens em relação ao de origem animal e deixa de ser visto como imitação
“Pode confiar, é couro legítimo!” No que diz respeito ao mundo dos automóveis, foi-se o tempo em que essa era uma grande vantagem ao anunciar o tipo de banco na hora da compra. Hoje se sabe que o revestimento de couro sintético (também chamado de “ecológico”) tem vantagens significativas em relação ao couro animal. “Ao longo dos anos, o vinil evoluiu para o que denominamos hoje de ‘couro ecológico’, em substituição parcial ou integral ao couro animal. Com 100% de couro sintético, o revestimento de um Volkswagen Jetta, por exemplo, tem tão boa qualidade que poucos conseguem distinguir um do outro”, afirma o engenheiro Francisco Satkunas, diretor conselheiro da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE Brasil).
Hoje o couro sintético está tão evoluído que, quando é de boa qualidade, quase todo mundo o confunde com o couro de origem animal. Isso ocorre não apenas no segmento automotivo, mas em cintos, bolsas e calçados, pois têm aroma, textura e tato igual ao do couro legítimo. “Essa evolução pode ser comprovada pela recente popularização do couro sintético, tão empregado atualmente quanto o couro de origem animal”, diz Glauci Toniato, gerente de marketing de produto da Mercedes- Benz do Brasil, que utiliza esse tipo de revestimento em parte dos seus automóveis de luxo.
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O custo mais baixo do couro sintético ainda é sua maior vantagem (chega a custar 60% menos que o de origem animal). Sendo industrializado a partir do petróleo, o artificial tende a ter sempre um preço menor que o natural também pela facilidade de personalização. O couro animal não tem um bom aproveitamento de corte, já que o boi não apresenta as formas retangulares de um banco de carro. Além disso, ocorrem várias perdas ao longo do processo e a própria pele do animal sofre mutilações por berne e outras doenças, provocando marcas irremovíveis.
Entre as desvantagens, o couro sintético ainda é menos resistente à abrasão e não deixa a pele humana transpirar como o natural, tendendo a ser mais desconfortável para o motorista e os passageiros. No entanto, o couro sintético é mais fácil de se manter, pois só precisa de um pano úmido para ser limpo – nunca se deve usar solvente, pois ele pode descolorir ou mesmo danificar o revestimento. Já o couro animal requer a cada seis meses, em média, hidratação com vaselina líquida ou produto apropriado para evitar rachaduras em razão do sol e do frio. Daí vem outra qualidade do revestimento sintético: são comuns casos de Mercedes equipados com o MB-Tex (leia texto ao lado) que após 15 anos ainda estão em ótimo estado de conservação, enquanto assentos de couro com essa idade revelam pequenas rachaduras, especialmente quando expostos ao sol com mais frequência.
Processo mais limpo
Outro benefício do sintético é que ele acarreta menos riscos ambientais que a produção de bancos com o couro animal. Há a poluição dos rios próximos à produção, a utilização de metais pesados como arsênio e cromo, bem como a própria necessidade do abatimento de animais – que requer um trabalho especializado. Por isso a indústria apelidou o sintético de “couro ecológico”. Embora esse termo seja empregado no dia a dia, desde 2005 vigora no Brasil uma lei que proíbe vender ou anunciar produtos com a palavra “couro” e suas variações para identificar materiais que não sejam constituídos de pele animal.
A tecnologia do revestimento sintético hoje é tão avançada que maciez, cheiro e demais propriedades fazem com que somente especialistas consigam diferenciar um do outro – no caso, claro, de um couro artificial de primeira linha. “Porém o couro animal ainda traz aspecto visual um pouco superior, além de ter propriedades de resistência maiores que as do sintético, conservando seu aspecto original por mais tempo”, diz Glauci Toniato, da Mercedes-Benz.
A indústria automotiva em geral usa couro natural apenas nas áreas mais sujeitas à abrasão, como no assento e encosto do banco do motorista e do passageiro dianteiro. As demais partes costumam ser de couro sintético, como laterais, área posterior dos bancos e acabamento das portas.
Via de regra, o controle das fábricas é muito mais rigoroso que o do mercado paralelo. Por isso é mais seguro optar por esse tipo de revestimento quando se trata de acessório original – ou no máximo quando é instalado na concessionária e vem com garantia. Se resolver investir num revestimento colocado fora da autorizada, prefira o natural. Nesse caso, confira a parte traseira do material que será colocado no banco: ele tem aparência e toque aveludados, como se fosse camurça, diferentemente do sintético, que tem trama regular igual a um tecido.
Entre as características físicas do sintético de boa qualidade, percebe-se que ele é macio, flexível, tem textura igual à do couro animal, tem o mesmo cheiro e não apresenta o ressecamento característico do vinil. Ao ser dobrado com muita força, o couro legítimo mostra pequenas rugas, como até a pele humana apresenta. Já o artificial, seja bom ou seja ruim, não apresenta essas rugas. O sintético de baixa qualidade, porém, é brilhante, tem textura grosseira e é pouco agradável ao toque. Quanto mais “plastificado” e distante da aparência do couro animal, pior a qualidade do couro sintético. Ao longo do tempo, a durabilidade também costuma ser inferior.
O revestimento de couro, sintético ou animal, é sempre mais caro que o tecido, mas traz suas vantagens. O tecido é um material mais acessível e mais elástico que o couro, porém é mais difícil de limpar e está mais sujeito a cortes e a desfiar, além de não transmitir a mesma sensação de qualidade. No entanto, a disseminação do uso do couro sintético poderá, segundo os especialistas, até nivelar no futuro o preço ao do tecido. E com isso a escolha de ter couro ou não nos bancos não dependerá mais da capacidade do bolso e sim da vontade do cliente, como hoje é a cor do automóvel.
NO TEMPO DO VINIL
Os bancos revestidos de couro nasceram praticamente com os automóveis, no fim do século 19. Como a maioria dos veículos era aberta, o couro era o único material que resistia às variações do tempo. Henry Ford chegou a ter fazendas para produzir o couro do Modelo T, entre outros. Era uma forma de controlar o preço no mercado – do contrário, dependeria do bom humor dos comerciantes de couro para outros objetos, como sapatos e roupas. Nos anos 1940 e 1950, o couro perdeu espaço nos bancos para as casimiras. Com o decorrer do tempo, os carros passaram a ser fechados com teto rígido e climatizados e, assim, a casimira passou a ser vista como mais nobre e inovadora que o couro. No Brasil, o Aero Willys 1962 saía de fábrica com banco inteiriço de couro. Porém os motoristas se queixavam que escorregavam muito nas curvas, pois ainda não existia o cinto de segurança. Depois houve predomínio do vinil, que era liso, brilhante e mais escorregadio, além de esquentar muito sob o sol, mas vinha com várias cores e tonalidades. A napa, um vinil de melhor qualidade, foi o primeiro produto com granulação parecida com a do couro e de maciez superior.
ARTIGO CARO
Não é qualquer couro artificial que tem um padrão de qualidade que possa ser confundido com sua versão animal. É o caso do MB-Tex da Mercedes-Benz (que o chama hoje de Artico) ou do Sensatec da BMW, que utilizam o material em seus modelos ou versões mais baratos. No caso da Mercedes, ele é usado desde antes dos anos 80 e há relatos de carros que mantêm até hoje a boa aparência.