Frenagem de emergência não é perfeita mas já evita muitos sustos no Brasil
Reconhecida pelos especialistas como importante sistema de segurança, a frenagem automática de emergência pode se tornar item obrigatório no Brasil
Desde que havia comprado seu Jeep Commander, o empresário Telio da Silva se incomodava com os alertas de frenagem que apareciam no painel do carro. Tudo mudou após uma viagem noturna pela rodovia BR-163, chegando ao município paraense de Santarém.
Telio estava a cerca de 110 km/h na estrada, ofuscado pelos faróis de quem vinha no sentido contrário. “O sistema deu o alerta sonoro, (indicando que havia um obstáculo no caminho), mas eu não vi nada na frente”, explica. Em seguida, o Commander freou sozinho: “Só então eu enxerguei uma moto a baixíssima velocidade, trafegando sem nenhuma luz acesa”, completa, com a certeza de que, não fosse a intervenção do carro, teria colidido gravemente com a motocicleta.
É justamente o fato de a frenagem automática de emergência (AEB, de Automatic Emergency Braking) proteger o lado mais fraco no trânsito que sua implantação vem sendo defendida até pela ONU. No Brasil, existe uma proposta desse sistema (e o de mudança involuntária de faixa) se tornar obrigatório.
“A consulta pública já foi realizada e o próximo passo é publicar a resolução do Contran”, explica o gerente de Engenharia da Bosch, Leimar Mafort. De acordo com a minuta, a obrigatoriedade terá duas etapas: para novos projetos de automóveis a partir de 2026 e para todos os novos veículos a partir de 2029.
Em tempos de carros cada vez mais complexos, a frenagem emergencial é relativamente simples. O sistema é composto por uma câmera com resolução equivalente à de um smartphone (instalada no para-brisa) e sensores de proximidade semelhantes aos que nos ajudam no estacionamento. Além disso, é necessário um programa de computador que sincroniza as informações e atua na frenagem do carro, semelhante ao que já é usado no controle de tração e estabilidade. Estudos pelo mundo já desenvolvem níveis mínimos de eficiência, na detecção de pedestres à noite, por exemplo.
Nos Estados Unidos, mais de 90% dos carros novos saem com AEB instalado, fruto de uma intensa campanha do Insurance Institute for Highway Safety (IIHS), que promove discussões científicas sobre o trânsito no país. Os resultados são claros: caminhonetes equipadas com o sistema se envolveram em 43% menos colisões na traseira de um veículo à frente, segundo o IIHS. A taxa de fatalidades ou ferimentos graves, apurou o estudo, foi 77% menor.
Notavelmente, os pedestres saem ganhando. Com veículos elétricos pesando cerca de 30% a mais que um equivalente a combustão, esse cuidado é ainda mais importante, pontuou o National Transportation Safety Board (NTSB), orgão do governo americano responsável pela segurança nos meios de transporte.
O AEB também vem se mostrando um grande aliado de motoristas idosos, que, com o aumento da expectativa de vida, serão cada vez mais comuns. Quase 60% dos acidentes com condutores acima dos 70 anos nos EUA, afirma o IIHS, poderiam ser ao menos reduzidos com a ajuda do AEB. O dispositivo de segurança foi um diferencial para que o economista Vinícius Ferreira convencesse seu pai a adquirir um Volkswagen Jetta.
“Trabalhamos muito e dirigimos pela cidade na maior parte do dia. É um custo pequeno (do AEB) perto do gasto de energia e recursos que uma colisão boba, causada por distração, nos causaria.” “Os vendedores não costumam exibir recursos de segurança como um diferencial na hora de convencer o comprador”, observou.
Em países como o Brasil, onde há muito mais ciclistas, motociclistas e pedestres dividindo espaço com os carros do que nos EUA, a frenagem tem potencial ainda mais transformador.
Segundo a Bosch, o AEB tem poder de evitar até 73% das colisões traseiras no Brasil. A ZF, por sua vez, exibe um dado desanimador: apesar de tantos predicados, só 5% dos carros novos têm esse recurso no país.
O motorista Telio da Silva trata esse equipamento como item obrigatório: “Depois desse susto, nunca mais compro um carro sem isso”.
O sucesso do Jeep Commander de Telio da Silva parece exceção: um ensaio surpreendente do IIHS, feito em agosto, reprovou 13 de 23 veículos no que diz respeito à frenagem autônoma à noite, quando ocorrem cerca de dois terços dos atropelamentos.
Ainda que as montadoras façam segredo sobre seus softwares, o instituto destacou que sistemas antigos ainda em uso são programados majoritariamente para evitar colisões com outros carros, não detectando pedestres, animais e pequenos objetos na pista. Outra recomendação é que as fabricantes invistam na qualidade das câmeras, facilitando o reconhecimento óptico.