Audi S3 x Mercedes CLA 45 AMG: os foguetes de cauda curta

Vou começar esse texto contando o final do filme: o vencedor do tira-teima é o S3, apesar de o Mercedes parecer superior. Ao ler as fichas técnicas de ambos, é a estrela de três pontas que brilha forte. O CLA tem 360 cavalos e custa R$ 330.900. O Audi responde com 286 cv. E seu preço sugere que ele pertence a uma categoria abaixo: sai por R$ 242.990. Lado a lado, os concorrentes se equivalem em vários atributos, como o conjunto mecânico, nível de equipamentos e tamanho.

Mas bastam alguns quilômetros atrás do volante de ambos e a leitura dos números vindos da pista de testes para desfazer as impressões equivocadas. Explico: mesmo sem ser o suprassumo de esportividade da Audi – papel que cabe ao RS 3 -, o civilizado S3 anda junto com o cupê bestial da Mercedes. Não é pouca coisa. O CLA 45 AMG carrega o símbolo de Affalterbach, uma espécie de título de honraria automotivo, e o broche da marca representa o ápice de poder da empresa. Para equipar o CLA e sua versão hatch – o Classe A 45 -, a Mercedes desenvolveu nada menos que o motor quatro-cilindros turbo mais potente do mundo.

Dotado de 360 cavalos, o propulsor tem injeção direta, pistões e virabrequim de aço forjado, turbina de dois canais e tecnologias de redução de atrito emprestadas do SLS AMG. Assim como o rival, o sedã da Audi conta com injeção estratificada, abertura variável de válvulas e muita pressão na turbina: 1,2 bar. Mas vai além: a marca das argolas aposta em taxa de compressão maior (9,3:1) – a Mercedes empregou 8,6:1. O resultado dessa engenharia é o problema da empresa: na prática, a potência superior não gerou números melhores que o do Audi. Ao contrário. O S3 registrou 5,1 segundos na prova de 0 a 100 km/h, ante 5,2 s do CLA. Nas passagens de retomada, os resultados também foram praticamente idênticos.

Agora esqueça o campo de provas. Vamos para o trânsito. O CLA não é a escolha ideal para uso diário. Parece que a Mercedes não incluiu molas na suspensão, de tão rígida que é. As respostas do motor ao acelerador também são extremas. Explosivo, o propulsor de 360 cv é ríspido aos comandos do pedal, devolvendo agilidade e estampidos pelo escapamento, som que anuncia a proximidade da fera.

TEM QUEM GOSTE

Essa brutalidade é um deleite para quem busca um esportivo visceral – eu adorei -, mas duvido que o sabor seja compartilhado com caronas. Quem tentar rodar com ele no asfalto das grandes cidades também vai sofrer bastante. Há outros exageros: para realçar o semblante malvado, a Mercedes optou por enfeitar o visual com truques, como rodas pretas e pinças de freio destacadas de vermelho. Por dentro, a tonalidade escarlate salta aos olhos nas costuras do painel, bancos e cintos de segurança. O Audi não tem nada disso. É discreto e quase não recorre a recursos visuais para ficar com cara de carro rápido.

A carroceria tem poucos adereços estéticos que denunciam a versão brava. De frente, é praticamente idêntico ao A3 Sedan, com grafismos diferentes nas entradas de ar laterais. No caso do Mercedes, as peças são bem maiores que as dos CLA “normais”. A história se repete na traseira. Enquanto o S3 é desmascarado pelo logotipo e um par de saídas duplas de escape, o AMG conta com um extrator de ar pronunciado e grandes fendas nas laterais do para-choque.

Aliás, por conta dos para-choques alargados, ambos são maiores e mais baixos do que suas versões normais. O CLA tem 469,1 cm de comprimento, 6,1 cm a mais. E é 1,6 cm mais baixo (141,6 cm) que os irmãos comportados. O S3 mede 446,9 cm, ante 445,6 dos A3 Sedan, mas preserva a largura idêntica. Na altura, porém, é 2,4 cm mais baixo – tem 139,2 cm.

Internamente, o Mercedes comum tem a alavanca do câmbio instalada atrás do volante, enquanto a versão AMG vem com aletas e um seletor de marchas no console. O Audi utiliza a mesma alavanca em todas as versões, substituindo apenas o acabamento da peça – é possível realizar as trocas manuais por ela ou por meio das borboletas atrás do volante.

Na mecânica, a receita de ambos é semelhante. Um motor 2.0 turbo, 4×4 sob demanda e transmissão automatizada de dupla embreagem (Audi tem seis velocidades; CLA, sete). O Mercedes privilegia a tração no eixo dianteiro, enviando força para trás quando as da frente começam a patinar. Já o sistema quatro atua nas quatro rodas por mais tempo – e essa diferença ajuda a explicar o bom desempenho do S3 nas retomadas e incrível estabilidade nas curvas.

Ambos são as configurações mais caras dentro da linha e têm uma lista de equipamentos parelha. Vêm de série com ar-condicionado digital de duas zonas, teto solar panorâmico, controle de tração e estabilidade, airbags laterais e de joelho, sistema multimídia com navegador, faróis de xenônio e sensor de estacionamento. O Audi conta com áudio da grife dinamarquesa Bang & Olufsen.

Mas só o Mercedes utiliza câmera de ré – o S3 vem com alarme sonoro e indicador gráfico de distância. E só a estrela de três pontas entrega rodas de 19 polegadas, bancos elétricos com memória, ajuste lombar pneumático e sistema de aquecimento. Os freios têm a função “hold”, capaz de manter o veículo parado em semáforos sem que o motorista precise deixar o pé sobre o pedal. São características bacanas, mas não justificam a diferença de R$ 82 710. O dinheiro é suficiente para comprar um Honda HR-V ou o novo Ford Focus – que tal um desses dois para usar nos dias de rodízio paulistano?

As qualidades do CLA são nítidas e convincentes, mas só se justificam para quem mora em um autódromo. Pelo equilíbrio da obra e valor mais coerente, o Audi S3 Sedan é a escolha ideal para viver na cidade.

AVALIAÇÃO DO EDITOR

MOTOR E CÂMBIO – O conjunto mecânico é o ponto forte da dupla. Têm potência de sobra e impõem respeito pela eficiência. Mas o CLA, apesar de ter o 2.0 quatrocilindros mais potente do mundo, não bate o S3.

DIRIGIBILIDADE – O CLA impressiona muito na pista, mas é cansativo no trânsito. A turbina entra com muita energia e a suspensão peca pelo excesso de rigidez. O Audi agrada nas duas situações.

SEGURANÇA – São equivalentes neste quesito. Têm airbags laterais e de joelho (para o motorista), ESP, controle de tração, faróis de xenônio e sensores no cinto de segurança.

SEU BOLSO – Apesar de este critério ter menor peso quando se fala em esportivos, o preço do CLA é excessivamente alto. Faltam justificativas para tanto, pois os carros são equivalentes em nível de equipamentos e até em desempenho.

CONTEÚDO – As duas marcas foram generosas: oferecem teto solar panorâmico, sensores de chuva e de luminosidade, faróis de xenônio e sistemas multimídia completos. E não há equipamentos opcionais, sem contar as opções de cores.

VIDA A BORDO – Conforto não falta, mas vale o gosto: as cores escuras do CLA ou a sensação de amplitude do S3. No banco traseiro, o Audi oferece mais espaço para a cabeça dos ocupantes. A silhueta de cupê compromete essa medida do Mercedes.

QUALIDADE – Ambos oferecem alto padrão de acabamento, mas o Mercedes leva a melhor. Tem mais superfícies cobertas por couro, costuras vermelhas até no painel, volante com empunhadura de Alcântara e pontos de iluminação espalhados na cabine.

VEREDICTO QUATRO RODAS

A vitória do Audi é quase óbvia. O S3 anda junto com o CLA, é confortável, mais espaçoso e incrivelmente mais barato. Não há como justificar tanta diferença de preço (R$ 87.910), o suficiente para comprar um SUV compacto.