O endereço fica no final da avenida Henry Ford, mas o que sobrou da Ford na fábrica que agora pertence à BYD, em Camaçari (BA), são alguns poucos dos caminhões que entram e saem da unidade e galpões. Estes galpões, inclusive, serão estratégicos para cumprir uma promessa: voltar a montar carros ali ainda em 2024.
QUATRO RODAS esteve no local para acompanhar a movimentação, entender como está o ritmo de ampliação da unidade e o impacto na região. Fizemos um pedido antecipado à BYD para visitar a fábrica, mas não foi atendido.
O andamento das obras civis é notável. Um antigo descampado à esquerda da entrada principal da fábrica já está ocupado por um enorme galpão, com colunas e telhado, enquanto a terraplanagem para construção de mais um galpão à frente já é feita. Também já constroem outro galpão próximo à outra saída da fábrica, para um lado onde há outras indústrias.
Estes serão os três primeiros de um total de 13 novos galpões que serão construídos em uma área do terreno que margeia a avenida Henry Ford. Não por acaso, outra frente de trabalho constrói novas cercas no local e instala novos postes, aparentemente, com mais linhas de energia.
Considerando tudo, serão 26 novas instalações entre galpões de produção, pista de testes e outras estruturas que vão ocupar uma área de cerca de 1 milhão de m² adjacente à fábrica que era da Ford.
As novas instalações ocuparão uma área do terreno que a Ford ocupava apenas com uma pista de testes. A BYD não abriu mão de ter uma pista, mas construirá uma nova em outra área do terreno próxima aos galpões antigos. Será útil para validação dos carros montados ali e para o centro de pesquisa e desenvolvimento anunciado pela fabricante, mas que ficará em Salvador (BA). Um dos primeiros esforços será para ter um motor flex.
Até o final de 2025
A BYD importou até a empresa de engenharia encarregada das obras civis, a Jinjiang Construction Group, que se estabeleceu no Brasil em fevereiro. As operações começaram em 3 de maio deste ano e a data de término está marcada para 31 de dezembro de 2025. A pedra fundamental, porém, foi lançada há exatamente um ano, em 9 de outubro de 2023.
De acordo com a BYD, passados os primeiros cinco meses, as obras seguem respeitando o cronograma original.
Na obra, fala-se que os trabalhos acontecem 24h. Moradores de Camaçari ainda contaram que é comum que peçam para trabalhar na obra em alguns finais de semana e feriados, e que a empresa paga todas as horas extras. O pagamento de um hotel local por parte da empresa de engenharia, porém, virou caso de polícia.
No comércio local, que passou por maus bocados quando a Ford encerrou a fabricação de automóveis, no começo de 2021, já se nota uma melhora no faturamento. Há, também, uma busca por técnicos e engenheiros para trabalhar no local. De acordo com a BYD, a unidade já emprega cerca de 800 pessoas. A previsão da BYD é gerar 1.200 empregos diretos e 5.000 indiretos.
A fabricante chinesa ainda construirá cinco prédios residenciais, a 3,5 km da fábrica, que serão destinados aos funcionários. Ocuparão uma área de aproximadamente 81 mil m² e terão a capacidade de abrigar 4.230 pessoas.
A BYD não é a única empresa chinesa instalada em Camaçari. Há cerca de dois meses a Goldwind inaugurou uma fábrica de turbinas eólicas na região. Foi um processo semelhante: assumiram uma antiga instalação da General Electric (GE) e agora prometem gerar 100 empregos diretos e 5.000 indiretos.
Carros, ônibus, caminhões e baterias
Quando era controlada pela Ford, a fábrica de Camaçari chegou a operar em três turnos com capacidade para fazer 250.000 unidades/ano dos modelos Ka e EcoSport. Mas pode demorar um tempo para que a BYD se iguale o nível de produção.
O planejamento da BYD prevê que, durante o primeiro ano de fabricação, a capacidade da unidade de Camaçari será de 150.000 veículos/ano, subindo para 300.000 no segundo. O objetivo final da BYD é chegar ao volume de 450.000 carros anualmente.
Isso não inclui apenas carros. A construção de novos galpões também será uma forma de liberar espaço para fabricar caminhões e ônibus elétricos na unidade. Além disso, a BYD também planeja fabricar baterias. O local terá maquinário para enriquecer o lítio para exportação. O investimento total será de R$ 5,5 bilhões, mas poderá ser aumentado para R$ 6,5 bilhões.
De maquinário, teria sobrado muito pouco dos tempos da Ford e os equipamentos já estariam obsoletos para o nível de mecanização ao qual os chineses estão habituados. Ao menos os galpões que já estavam prontos permitirão que a BYD comece a montar carros mais cedo.
O segredo para montar carros no local ainda em 2024 será uma operação SKD, com carrocerias que já chegam soldadas, pintadas e, muitas vezes, com parte dos acabamentos internos montados. Mas essa etapa, a fabricante reforça, vai durar muito pouto tempo.
Nesse regime de produção a montagem dos carros será finalizada no Brasil sem demandar, por enquanto, a ativação de uma linha de pintura ou muitos robôs. É uma operação que depende de mais mão de obra e envolveria a montagem dos sistemas elétricos, de suspensão, freios e de tração dos carros. O ritmo de produção também é menor, mas o suficiente para complementar as importações.
Isso porque ajuda a reduzir a demanda pelo transporte especializado de automóveis prontos em navios: os kits de carros desmontados podem ser transportados em containers convencionais, aproveitando a rota de mais navios. Ainda que esses primeiros carros não sejam tão nacionais assim, ajudarão no desenvolvimento da cadeia de fornecedores nacionais de forma gradual.
Quando a BYD vai fabricar carros no Brasil?
A BYD não esconde que o processo de fabricação carros no Brasil vai começar, efetivamente, em 2025. Neste ponto, a fabricante chinesa avançaria para o processo de produção, iniciando os processos de armação, soldagem e pintura da carroceria na fábrica de Camaçari. Também neste momento 25% dos componentes passarão a ser fabricados no Brasil, aproveitando a operação de fabricantes locais ou de fornecedores chineses que a BYD está atraindo para o Brasil.
É por isso que, embora ainda não fale abertamente sobre exportar os carros montados no Brasil, a BYD já está se movimentando para facilitar sua logística: solicitou ao governo da Bahia a utilização de área do Porto de Aratu, também conhecido na região como “Porto da Ford” e que era de uso exclusivo da fabricante. A BYD, porém, não terá uso exclusivo do local, que pertence ao Estado da Bahia.