O termo “indústria da multa” é bem conhecido e abre margem para o entendimento que a fiscalização do trânsito é mais punitiva ao condutor do que educativa. Sem a intenção de entrar no mérito de qual dos lados, motoristas ou agentes fiscalizadores, está correto, a questão é que no Brasil o sistema de autuação não é dos mais rígidos do mundo. Afinal, a maioria das infrações no país é por exceder a velocidade permitida em até 20% ou de 20 até 50%, segundo a Senatran (Secretaria Nacional de Trânsito). Elas custam, respectivamente, R$ 130,16 e R$ 195,23 e esses valores representam cerca de 10% do salário mínimo estipulado no Brasil.
Porém, na Finlândia, por exemplo, o valor de uma multa por exceder a velocidade pode ser de 121.000 euros, o equivalente a R$ 746.000. Anders Wiklöf recebeu a multa extremamente elevada após dirigir a 32 km/h além do limite de velocidade estabelecido pela via. Dirigiu a 82 km/h em uma área limitada a 50 km/h.
No país nórdico esse tipo de infração se ajusta ao perfil do infrator e, portanto, à sua renda. Para fazer isso, o sistema se baseia no rendimento diário, divide por dois, e chega ao valor da punição. A partir da velocidade excedida, o governo decide quantas “diárias” serão consideradas.
O sistema já atingiu um máximo de 120 dias de “privação de gastos”, mas não tem um limite de valor que pode ser atingido. Esse formato é proposital, já que os autores da lei querem que a punição permaneça proporcional à renda de cada motorista e entendem que é uma determinação mais justa e que tem como objetivo evitar a reincidência da infração independentemente da posição social ou renda anual do condutor.
Outro caso ocorreu com o diretor da Nokia, Anssi Vanjoki, que foi pego acima do limite de velocidade. Ele estava com sua Harley-Davidson a 75 km/h em uma via que tinha 50 km/h como limite. Como resultado, o executivo recebeu uma multa de 116.000 euros, algo em torno de R$ 715.000.
Uma outra situação levantada pelo jornalista Joe Pinsker, do The Atlantic, é a do empresário Reima Kuisla. Ele foi pego a 105 km/h em uma via que tinha 80 km/h como limite. E Kuisla havia declarado uma renda de cerca de 6,5 milhões de euros, o que resultou na multa de 54.024 euros (R$ 333.000).
Para efeito de comparação, um cidadão que cometa a mesma infração que o empresário Reima Kuisla, mas que ganhe 50.000 euros por ano e não 6,5 milhões, e não tenha filhos pequenos, terá que pagar cerca de 345 euros (R$ 2.127).
Kuisla protestou contra o alto valor em uma rede social. “Para as pessoas mais ricas e que têm maior renda, a Finlândia é um país impossível de se viver”, afirmou. Após receber a cobrança, ele fez 12 publicações com tom elevado, onde inclusive falava que, com o valor, poderia comprar uma nova Mercedes.
Quando procurado pelo The New York Times, ele disse que não daria entrevista, mas afirmou que “o jeito que as coisas são feitas na Finlândia não faz o menor sentido”. Outro cidadão finlandês, multado em 50.000 euros, disse que os valores eram fruto de um “estado que não é governado constitucionalmente”. Por conta de toda a repercussão das quantias, as duas multas, tanto de Reima Kuisla como de Anssi Vanjoki, foram reduzidas.
Nos Estados Unidos, o sistema chegou a ser testado em algumas regiões. A diretora executiva da ONG Justice Strategies, Judith Greene, ajudou a implementar um teste do sistema em Staten Island. Esse sistema não progrediu em território norte-americano porque, de acordo com as autoridades, as punições não eram severas o suficiente.
No Brasil a média de valor das multas é bem mais baixo, mas a infração mais cara, referente ao artigo 253-A do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), prevê o pagamento de R$ 17.608,20 por “organizar interrupção da via sem autorização”. Essa é uma das 20 multas autossuspensivas que têm a ação de suspender a CNH do infrator de forma imediata.
A outra forma de ter a CNH suspensa é ultrapassando o limite de pontuação, que desde abril de 2021 é de 40 pontos. Antes da mudança o limite era de 20 pontos. Esse máximo só é válido caso o motorista não cometa nenhuma infração gravíssima, porém se cometer uma gravidade, cairá para 30, e se cometer duas ou mais, cairá para 20. Veja abaixo as multas brasileiras mais severas.
No Brasil: multas que suspendem a CNH de imediato
As infrações autossuspensivas têm o poder de suspender a CNH de imediato, além de ter custo elevado e algumas são fáceis de cometer. Entre elas: exceder em mais de 50% a velocidade máxima, o que implica em uma infração gravíssima, ao custo de R$ 880,41. Basta passar a 64 km/h em uma lombada eletrônica com velocidade permitida de 40 km/h, por exemplo, para perder a habilitação por oito meses consecutivos.
E há também as mais polêmicas, que envolvem a lei seca. A simples recusa ao teste do bafômetro em uma blitz rende também a suspensão imediata da habilitação, porém dirigir sob o efeito de álcool também promove a mesma punição e o valor da multa é idêntico:
R$ 2.934,70. No último caso a suspensão já tem prazo predefinido: 12 meses.
Há ainda duas infrações com valor mais acessível, porém também suspendem a CNH de imediato. “Dirigir ameaçando os pedestres ou demais veículos” e “Transpor, sem autorização, bloqueio viário policial”. Ambas custam R$ 293,47. Há outras quatro infrações autossuspensivas no mesmo valor, porém são referentes a motociclistas.
O período que o condutor deverá permanecer com a CNH suspensa pode variar entre dois a oito meses quando se trata de autuações que impõem a suspensão imediata. Quando ela ocorrer pelo limite de pontos, a suspensão poderá durar de seis meses a um ano.
Confira abaixo as 20 multas autossuspensivas:
Dirigir sob a influência de álcool – R$ 2.934,70 |
Recusar teste do bafômetro – R$ 2.934,70 |
Dirigir ameaçando os pedestres ou os demais veículos – R$ 293,47 |
Disputar corrida – R$ 2.934,70 |
Promover “racha” – R$ 2.934,70 |
Realizar manobra perigosa – R$ 2.934,70 |
Condutor envolvido em acidente deixar de prestar socorro – R$ 1.467,35 |
Condutor envolvido em acidente não adotar medidas de segurança no local – R$ 1.467,35 |
Condutor envolvido em acidente não facilitar o trabalho da perícia – R$ 1.467,35 |
Condutor envolvido em acidente se recusar a mover o veículo do local – R$ 1.467,35 |
Condutor envolvido em acidente não prestar informações para B.O. – R$ 1.467,35 |
Forçar passagens entre veículos – R$ 2.934,70 |
Transpor, sem autorização, bloqueio viário policial – R$ 293,47 |
Transitar em velocidade superior a 50% da máxima permitida – R$ 880,41 |
Conduzir motocicleta, motoneta ou ciclomotor sem usar capacete de segurança ou vestuário de acordo com as normas e especificações do Contran – R$ 293,47 |
Conduzir motocicleta, motoneta ou ciclomotor transportando passageiro sem o capacete ou fora do assento correto – R$ 293,47 |
Conduzir motocicleta, motoneta ou ciclomotor fazendo malabarismo ou empinando – R$ 293,47 |
Conduzir motocicleta, motoneta ou ciclomotor transportando criança menor de 10 anos ou que não tenha condições de cuidar da própria segurança – R$ 293,47 |
Usar o veículo para interromper a circulação da via sem autorização – R$ 5.869,40 |
Organizar interrupção da circulação da via sem autorização – R$ 17.608,20 |