Jeremy Clarkson: Hyundai HB20 tem um irmão europeu, e ele não faz sentido
Depois de se perder em devaneios, colunista chega à conclusão de que, em alguns casos, andar de Uber pode ser melhor do que comprar um i10
Dirigir no centro de Roma é uma das experiências mais enriquecedoras que a vida pode oferecer. Eu adoro a combatividade dos motoristas e o senso de que os semáforos não foram colocados ali para organizar o tráfego, mas para permitir aos motoristas resolver disputas.
Se você optou por parar no sinal vermelho, o que não é algo sempre garantido, o verde subsequente é uma oportunidade para provar que você tem um carro mais rápido do que o cara ao lado.
O resultado é uma cidade que se move. Uma cidade eletrizante. Uma cidade onde você realmente pode ficar na expectativa de seu deslocamento diário.
Estacionar também é uma delícia, porque não existe espaço pequeno demais. Se conseguir colocar pelo menos um pedacinho do carro na vaga, você pode usar seus para-choques para fazê-la ficar maior. Ou pode simplesmente parar onde quiser.
E você sabe que não será incomodado pelos agentes de trânsito, porque eles estão todos ocupados admirando seus reflexos nas vitrines das lojas. Até as pastinhas usadas pelos agentes de trânsito na Itália foram desenhadas – não estou brincando – pela Fendi.
Mas não é só em Roma que dirigir é essa delícia. Isso vale para toda a Itália. Se tivesse de listar meu maior sonho de dirigir de todos os tempos, seria disparar pela Costa Amalfitana em uma Alfa Romeo Spider, a caminho de um restaurante debruçado sobre um penhasco para saborear uma bruschetta.
O sol estaria brilhando e a Claudia Cardinale estaria no banco do passageiro, usando um lenço de pescoço. É por isso que eu sempre adorei carros italianos. Até o mais lúgubre Lancia Dedra ou Fiat Croma possui, em algum lugar do seu DNA, um lembrete de como dirigir deveria ser.
Se eu pudesse, faria com que todos os carros fossem desenhados por italianos. Todos eles teriam aquele espírito de twin-cam nervoso, que não pode ser silenciado.
Conforme um dirigente da Lamborghini me disse recentemente: “Se for forçado [pela nossa empresa-mãe, a Volkswagen] a fazer um carro elétrico, eu me suicido”. E ele não está sozinho. Até agora, a Fiat não produz um único carro que ande à base de baterias.
Ela tem um planejado, mas dá para sentir que ele será lançado com uma mistura de indiferença e decepção.
Infelizmente, no entanto, os italianos estão fora de sintonia, como eu. O resto do mundo desenvolvido colocou na cabeça que o carro é uma ferramenta para levar crianças pequenas, de uma forma segura e econômica, para a escola, e que o meio ambiente tem algo a ver com isso.
De forma geral, não compramos mais carros porque são bonitos ou fazem um som que nos arrepia. Agora só queremos saber que conectividade eles têm e se são capazes de dirigir sozinhos por curtos períodos.
Também é importante que eles tenham excelentes sistemas de GPS, que usem tecnologia espacial para detectar o tráfego à frente e recalcular nossa rota para evitar o problema.
Mesmo se isso fizer com que você pegue durante o trajeto ruas com grama crescendo no meio da pista ou um riacho para cruzar. Ou ruas residenciais com lombadas em todas as quadras.
Qual era o problema com a rodovia? Provavelmente, nenhum.
Há pouco tempo eu recebi um vídeo de um homem caminhando por várias ruas desertas de Berlim com um carrinho que levava 99 celulares, e assim fazendo com que o Google Maps identificasse essas ruas como engarrafadas.
Por que ele estava fazendo isso? Não tenho ideia.
É contra isso que estamos lutando. Lunáticos barulhentos com tempo de sobra nas mãos e acesso a todo e qualquer pensamento idiota da humanidade, pela internet. Eles devem ter colocado na cabeça que carros são ruins. Então eles são.
Um débil mental de classe média da Extinction Rebellion recentemente se deu ao trabalho de visitar uma exposição automobilística sendo realizada no Victoria and Albert Museum de Londres só para enfeitar uma das peças em exibição com alguns panfletos da sua organização.
Mesmo assim, nossa atitude imperfeita é melhor do que o sistema que desenvolveram na Índia. As coisas ficaram tão ruins que, em Bombaim (ou Mumbai, como a BBC gosta de dizer), eles equiparam uma série de semáforos com decibelímetros, para fazer com que o farol continuasse vermelho até que os motoristas parassem de buzinar.
No começo, eles ficavam tão enraivecidos pelo retardamento que buzinavam com mais vigor ainda, mas eventualmente perceberam que, se quisessem andar, teriam de se manter em silêncio.
Mas não tenha dúvida: uma tecnologia semelhante será empregada aqui no Reino Unido para punir os árabes ricos que vêm a Londres todos os anos e cometem o crime hediondo de entrar nos seus supercarros ensurdecedores e “passear por aí”. Passear por aí não é permitido.
Dirigir pela Costa Amalfitana com a Claudia Cardinale seria até mesmo reprovado pela maioria dos britânicos. “Por que você não tomou um ônibus?”, diriam eles. Porque não existe romance em um ônibus. Porque não é uma coisa com que uma pessoa sonha.
Porque não é delicioso. E que sentido faz estar vivo se tudo o que você quer é tomar um ônibus para Berlim e andar pela cidade com um carrinho cheio de celulares, para atormentar a vida de todos os demais?
Bom, depois desse desabafo, estou pensando em ir no próximo final de semana à Escócia, em uma Alfa Romeo Quadrifoglio, para dirigir de Inverness até Ullapool.
Porque, quando eu chegar ao topo de um morro e enxergar aquela cobra cinzenta afilada desaparecendo no próximo horizonte, impossivelmente recortado, meu coração estará cheio da expectativa das emoções que terei pela frente. Um ônibus não consegue oferecer isso.
Bom, depois desses devaneios da minha cabeça, vamos ao assunto deste artigo: o Hyundai i10. Ele é um carro ideal, se você quiser gastar 12.495 libras em um Hyundai pequeno de cinco portas. Não há nada de errado com isso, realmente.
Exceto que, se tudo o que quiser for transporte personalizado confiável e conveniente, você vai estar mais bem servido usando Uber nas cidades e trens para viagens mais longas.
Esse é o problema com carros como este. Se são vendidos como ferramentas sem alma – refrigeradores com GPS e tecnologia de prevenção de colisões – vamos rapidamente perceber que a melhor e mais barata forma de se deslocar é não tendo um carro.
* Por que não chamar Florença de “Firenze”?
Clarksômetro: | Hyundai i10 |
Motor | 1.197 cc, 4 cilindros, 83 cv a 6.000 rpm, 12 kgfm a 4.000 rpm |
Câmbio: | automático, 6 marchas, dianteiro |
Peso: | 932 kg |
Desempenho: | 0 a 100 km/h em 12,6 s; veloc. máx., 170 km/h |
Preço: | 12.495 libras (R$ 79.343) |
Nota do Jeremy: | três estrelas |
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