O céu amanheceu fechado no dia em que agendamos as fotos deste comparativo. Uma chuva acabaria com nossos planos, mas a probabilidade de cair água estava baixa. Era o sinal que precisávamos para encarar a estrada com a capota aberta.
Afinal, roadster que se preze roda com a cabine à mostra. E a insistência valeu a pena: a luz do sol resolveu dar as caras para o Porsche 718 Boxster e o Audi TTS.
Essa dupla de conversíveis têm muito em comum. Ambos são alemães, têm teto de tecido com abertura elétrica, só dois lugares, turbo, potência em torno de 300 cv e preço na casa dos seis dígitos.
A maior diferença está na mecânica. Porsche com seu tradicional motor boxer; Audi e sua clássica tração integral Quattro.
Sob o capô do esportivo vindo de Stuttgart, a grande novidade: o propulsor do Boxster tem quatro cilindros opostos, não seis. Já o TT é mais dócil. Tem menos botões no cockpit, mais assistência eletrônica à mão e um sistema multimídia matador. No asfalto e sob sol forte, veja qual se saiu melhor.
Os carros da Porsche são célebres por preservar tradições. Eles ritualizam o ato de dirigir. É como fazer a barba. Você pode usar um Bic descartável de R$ 5, um Braun elétrico de US$ 80 ou ir ao barbeiro com hora marcada.
E lá se render a uma cerimônia: um hipster tatuado abre seus poros com uma toalha quente embebida em sândalo. Então aplica um creme de verbena e, por último, manobra uma navalha que parece ter sido afiada por Deus. O novo 718 Boxster adota o rito longo.
A chave precisa ser inserida e girada em um cilindro para ligar o motor. Como em todo Porsche, a peça fica colocada à esquerda, como ocorre há décadas.
No painel de instrumentos, relógios analógicos – claro! – com ponteiro laranja e mostradores redondos. O conta-giros destacado no centro da peça está milimetricamente posicionado atrás da direção. O volante é quase vertical e se impõe para o motorista.
Há poucas distrações para quem dirige: nada de botões do som ao alcance dos dedos ou comando para atender o celular. Por entre os aros da direção, os paddle shifts de metal reluzem atrás do aro.
Já o Audi tem discretas aletas plásticas, pequenas, iguais às que você encontra no sedã mais básico da montadora, embora funcionem tão bem quanto.
No TT, o motorista fica cara a cara com um quadro de instrumentos de alta resolução incrível, todo digital, configurável, concentrando as informações do sistema multimídia (GPS, rádio e câmera de ré). Ele substitui a tradicional tela no centro do painel.
No Porsche, tarefas não relacionadas ao ato de dirigir foram suprimidas ou escondidas, como os porta-copos, camuflados por um filete cromado no painel. Não há porta-objetos no console – apenas um pequeno compartimento na parte inferior das portas. Cabe uma carteira, no máximo.
Enquanto o Audi lhe convida a ouvir uma bela música no sistema de som Bang & Olufsen, com a eletrônica servindo ao conforto de quem dirige, o 718 não dá moleza.
Você se senta a um palmo do assoalho, com os olhos na altura das lanternas dos demais carros. Apesar de a Porsche já ter se rendido à direção com assistência elétrica, o volante é pesado. Requer que você force os músculos para manobrar. No entanto, ele oferece a precisão de um bisturi.
O Boxster também exige frugalidade do dono, que não pode carregar muita bagagem. São dois compartimentos pequenos. Sob o capô, um espaço de 150 litros tomado quase inteiramente pelo estepe. Atrás, outro de 125. Já o TT tem um porta-malas único, de 280 litros, na parte traseira.
Sinal dos tempos
A Porsche passou a utilizar um motor boxer de quatro cilindros turbo, abrindo mão do tradicional seis cilindros. É o tipo de decisão que não costuma ser tolerada por fanáticos, mas a prática revelou bons frutos.
Marcamos 4,7 segundos para ir de 0 a 100 km/h, com números de retomada compatíveis com seus 304 cv. E apesar de ser menor, o novo trem de força tem 35 cv a mais que o antecessor.
Além disso, o Boxster conta com a melhor transmissão criada pelo homem, a famosa PDK automatizada de dupla embreagem. No dia a dia, quase não se sente as trocas de marchas. E impressiona a capacidade da central eletrônica em escolher a melhor relação possível em cada situação.
Mas o TT também tem suas tradições, como a tração integral Quattro. Nas curvas, o sistema trabalha em conjunto com amortecedores magnéticos, cuja rigidez se ajusta conforme o piso e estilo de condução.
O Audi também conta com o Drive Select, um programa eletrônico que modifica as respostas do motor, assistência da direção e no módulo do câmbio automatizado S-Tronic.
O foco na direção esportiva do Boxster tem efeitos colaterais: ele não tem câmera de ré, por exemplo. Só um sensor com alerta gráfico. A proximidade de obstáculos é denunciada na tela touch no painel.
Esse display, aliás, tem sensibilidade de tablet, com uso semelhante ao do gadget. Ele está integrado com duas entradas de cartão SD, auxiliar e USB no porta-luvas.
Lado a lado, a diferença de tamanho é nítida. O Boxster tem 437,9 cm de comprimento, 18,8 a mais que o TT. Mas o Audi conta com entre-eixos maior (250,5 x 247,5 cm). E isso deixa os rivais em condição de igualdade quando se fala em espaço interno.
Na traseira do TT, um filete de leds integrado à carroceria faz as vezes de brake-light, conectando as lanternas. À noite, gera um belo efeito quando se pisa no freio.
Estratégia semelhante é adotada nas setas. Quando acionadas, seus leds se acendem aos poucos, em sequência. Porém, são truques somados a recursos de estilo gastos, como as pinças de freio vermelhas e apliques de cromo fosco nos retrovisores.
Nada disso é encontrado no Porsche, mais elegante e, na medida do possível, mais discreto em comparação ao esportivo de Ingolstadt.
Mas isso não é demérito ao TTS, pelo contrário. O Audi, em sua terceira geração, permanece fiel aos traços de quando foi lançado, em 1998. E seu visual é magnético como poucos.
Na versão S, o TT mais caro desenvolve 286 cv, mas tem a mesma quantidade de torque (38,8 mkgf) do 718. Isso explica o resultado próximo ao do Porsche nas retomadas.
O Audi ficou atrás no 0 a 100 (5,1 s) e no teste de consumo rodoviário. Enquanto o Boxster rodou 13,5 km com um litro de gasolina, o TTS marcou 10,7 km/l.
O encontro do Boxster (R$ 341.000) e TTS (R$ 324.990) ocorre de forma cruzada: a versão de entrada do 718 pega a mais cara do Audi – o TT parte de R$ 309.990.
Se quiser mais potência, há o Boxster S (359 cv, R$ 432.000). Mas aqui, o Porsche básico, mais rápido, econômico e bem-acabado que o TT, já foi o suficiente para vencer o comparativo.
Avaliação do editor
Motor e Câmbio – Nesse quesito, as marcas adotaram estratégias distintas, mas ambas com resultados notáveis. O boxer da Porsche é mais potente e mostrou-se mais econômico. E a caixa de transmissão da marca é incrível. Porém, a tração Quattro da Audi também é digna de elogios.
Dirigibilidade – O Audi é impecável nesse aspecto, mas é justamente o ponto forte do Boxster. Os Porsche são feitos para quem aprecia dirigir.
Segurança – Eles se equivalem em itens de segurança passiva e ativa. Na frenagem, oPorsche foi bem melhor a partir de 120 km/h. O Audi venceu no 60 a 0.
Seu bolso – Não custam pouco. Mas o Audi é bem menos caro. Por ser prático no uso diário, é até uma escolha mais sensata – do ponto de vista financeiro, claro.boxster
Conteúdo – São bem equipados, com vantagem para o TTS. O Porsche favorece o estilo ea tradição, abrindo mão de equipamentos que são essenciais no dia a dia, como a câmera de ré.
Vida a bordo – Ambos são espaçosos e oferecem nível de comodidade semelhante. OPorsche favorece quem é fã de dirigir. O TTS agrada mais a quem prefere praticidade e é mais amigável no uso diário.
Qualidade – Ambos têm acabamento bastante esmerado. Mas só o Porsche é impecável.
Veredicto
O 718 Boxster é mais caro, mas entrega mais. Porém, é um carro feito para quem viaja pelo prazer de dirigir. O Audi oferece conforto, esportividade e praticidade no dia a dia. Tem até custo-benefício melhor. Mas não é um Porsche.
Teste de pista (com gasolina)
Boxster | TTS | |
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Aceleração de 0 a 100 km/h | 4,7 s | 5,1 s |
Aceleração de 0 a 1.000 m | 23,5 s – 226,1 km/h | 24,6 s – 214,8 km/h |
Retomada de 40 a 80 km/h (em D) | 2,1 s | 2,6 s |
Retomada de 60 a 100 km/h (em D) | 2,7 s | 2,9 s |
Retomada de 80 a 120 km/h (em D) | 3 s | 3,3 s |
Frenagens de 60 / 80 / 120 km/h a 0 | 16,8 / 23,6 / 53,1 m | 15 / 25,6 / 59,1 m |
Consumo urbano | 8,8 km/l | 8,7 km/l |
Consumo rodoviário | 13,5 km/l | 10,7 km/l |
Porsche 718 Boxster | Audi TTS | |
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Motor | gas., traseiro, boxer, 4 cil., 1.988 cm³, 16V, turbo, injeção direta, 91 x 102 mm, 9,5:1, 304 cv a 6.500 rpm, 38 mkgf de 1.950 a 4.500 rpm | gasolina, dianteiro, 4 cil. em linha, turbo, injeção direta, 16V, 1.984 cm³, 82,5 x 92,8, 10,5:1, 286 cv entre 5.300 e 6.200 rpm, 38,8 kgfm de 1.800 a 5.200 rpm |
Câmbio | PDK, automatizado, 7 marchas, tração traseira | automatizado, seis marchas, tração integral |
Suspensão | McPherson (diant e tras.) | McPherson (diant.), multilink (tras.) |
Freios | discos ventilados | discos ventilados |
Direção | elétrica, 11 m (diâm. giro) | elétrica , 11,9 (diâm. giro) |
Rodas e pneus | liga leve, 265/35 R20 (diant.), 235/35 R20 (tras.) | liga leve, 245/35 R19 |
Dimensões | comprimento, 437,9 cm; altura, 128,1 cm; largura, 180,1 cm; entre- eixos, 247,5 cm; peso, 1.365 kg; porta-malas, 275 l, tanque, 54 l; | comprimento, 419,1 cm; largura, 183,2 cm; altura, 134,5 cm; entre-eixos, 250,5 cm; peso, 1.395 kg; porta -malas, 280 l; tanque, 55 l |
Equipamentos de série | ar-condicionado digital de duas zonas, multimídia com tela touch, Bluetooth, GPS e toca-discos, bancos elétricos com memória, faróis de xenônio, luzes de posição led, sensor de estacionamento (diant. etras.), suspensão ativa, bancos de couro | ar-condicionado digital, sensor de estacionamento (dianteiro e traseiro com câmera de ré e alerta sonoro), sistema de som multimídia MMI com falantes Bang & Olufsen, GPS, Audi Magnetic Ride, banco de couro Napa, sensor de luz e chuva, seletor eletrônico de rodagem, Audi Virtual Cockpit, faróis de led |
Preço | R$ 341.000 | R$ 324.990 |