O sol ainda estava nascendo quando recebi as chaves de um funcionário da Porsche. Antes de iniciar o test-drive pelas ruas da Cidade do Cabo, fiquei alguns minutos observando o novo 911 GTS. Quase nada mudou no design (apenas para-choques e faróis de neblina são novos), a ponto de a própria marca rotulá-lo de “reestilização”.
Tudo está no lugar de sempre. A posição de dirigir é a mesma – e isso é ótimo. Conta-giros no centro do painel? Sim. Nada mudou na disposição dos comandos. Giro a chave (do lado esquerdo, é claro) e… opa, alguma coisa está diferente. Ou melhor, soa diferente.
Derrubando a tradição, a marca resolveu adotar turbocompressores em toda a linha 911, para desgosto de inúmeros entusiastas. Diante de tanta polêmica, eu tinha uma chance rara em mãos: descobrir se a decisão foi acertada ou não.
Até então o último 911 com aspiração natural, o GTS extrai 450 cv do motor 3.0 biturbo, que também é aproveitado nos 911 Carrera e Carrera S. Assim, a potência é o que separa os modelos Carrera (370 cv), Carrera S (420 cv) e GTS (450 cv), enquanto o numeral 4 indica a presença da tração integral.
Associado ao câmbio de dupla embreagem PDK (única opção de transmissão a ser oferecida no Brasil ainda no primeiro semestre, juntamente com as carrocerias Coupé, Cabriolet e Targa), o GTS baixou o tempo de seu antecessor em quase meio segundo, levando 3,6 segundos para ir de 0 a 100 km/h no modo Sport Plus.
A velocidade máxima é de 308 km/h no Carrera 4 GTS e 310 km/h no Carrera GTS, ambos com câmbio PDK. Se a escolha for pela caixa manual de sete marchas, o 911 vai até 310 km/h no Carrera 4 GTS e 312 km/h no Carrera GTS.
Diferente da maioria dos 911, que são bastante parecidos entre si, o GTS traz elementos para diferenciá-lo dos outros Carrera. Um deles é a carroceria alargada em 44 mm nos para-lamas traseiros, solução emprestada do Carrera 4. As belas rodas de liga leve de 20 polegadas com cubo central também equipam o GTS, identificado pelos detalhes externos pretos.
As versões com tração traseira trazem um filete negro ligando as lanternas, e as opções com tração integral trocam o adereço por uma régua iluminada.
O roteiro elaborado pela Porsche abrangia diversos tipos de vias, incluindo ruas estreitas, rodovias largas, trechos montanhosos e até uma pista de corrida. Assim que deixamos a cidade, selecionei o modo Sport e notei duas mudanças imediatas no comportamento do veículo.
A primeira ocorreu no escapamento, cujo ronco vindo das saídas centrais ficou ainda mais alto. É um som progressivo nas acelerações que se torna deliciosamente rouco toda vez que o motorista alivia o pé do acelerador.
A segunda alteração surge no comportamento do câmbio, executando as reduções mais cedo, esticando as marchas por mais tempo e realizando as trocas em menor tempo. A brincadeira atinge outro nível no modo Sport Plus, que também ativa o controle de largada.
Nos modelos com transmissão PDK, o 911 tem a função Sport Response, responsável por fazer motor e câmbio reagirem prontamente assim que solicitados por 20 segundos ininterruptos.
Não é preciso acelerar muito para sentir o poder de fogo do 911. Basta provocá-lo levemente para sentir uma força surreal pressioná-lo contra o banco. Muito direta, a direção responde prontamente aos comandos (especialmente no ajuste Sport Plus) e sobra aderência nas curvas.
Se a maioria dos esportivos demanda cautela para não infringir os limites de velocidade, o 911 GTS requer atenção triplicada para não colecionar barbeiragens, dado a perigosa combinação de distribuição de peso desigual (menos de 40% na dianteira) em um carro com motor traseiro mais o excesso de confiança típico de motoristas empolgados.
Mesmo assim, vale frisar que o GTS é um dos modelos mais equilibrados entre todos os 911. No dia a dia, a suspensão bem acertada agrada em pisos irregulares e superfícies planas.
Antes do almoço, fomos ao autódromo de Killarney, ideal para conhecer o Porsche Track Precision App. Compatível com qualquer smartphone, o aplicativo lembra os programas de telemetria usados em corridas. As análises são feitas baseadas em um banco de dados da Porsche e em informações coletadas via GPS do celular, informando números como temposde volta, pontos de frenagem ou detalhes do traçado.
Assim, o usuário pode identificar acertos e erros para melhorar sua pilotagem. São mais de 130 pistas cadastradas, e novos circuitos podem ser incluídos.
Além do aplicativo, o GTS sai de fábrica com sistema de amortecedores adaptáveis (PASM) nas versões Cabriolet e Targa. No Coupé, a lista de itens de série é reforçada pelo controle dinâmico de chassi, que oferece molas mais firmes, barras estabilizadoras reforçadas e suspensão rebaixada em 20 mm. Nosso GTS tinha ainda eixo traseiro esterçante e revestimento interno em Alcantara, ambos opcionais.
Foi difícil achar defeitos no 911 GTS. Mesmo assim encontrei três. Achei a direção leve demais no modo Sport, diferente da calibragem firme do modo Sport Plus. Outro ponto negativo é a ergonomia: alguns comandos estão em posição muito ruim, dificultando a visualização – seria melhor também se os botões de volume ficassem nas laterais do volante, assim como os comandos de telefonia.
E o último senão é o preço inacessível para a maioria dos mortais – especialmente no Brasil, onde a etiqueta do modelo vai variar de R$ 687.000 a R$ 783.000. Nesse caso, porém, admito que a culpa não é da Porsche. É minha mesmo.
Veredicto
Aposentar o motor aspirado só fez bem ao 911 GTS, que ficou mais potente e segue sendo uma opção sedutora para quem quer mais do que um Carrera S, mas ainda não pode ter um GT3.
Ficha técnica – Porsche 911 GTS
- Preço: R$ 687.000
- Motor: gas., tras., long., 6 cil., boxer, turbo, 2.981 cm3, 24V, 10,0:1, 450 cv a 7.500 rpm, 56,1 mkgf a 2.150 rpm
- Câmbio: automatizado, dupla emb., 7 marchas, tração traseira
- Suspensão: McPherson(diant.), multilink (tras.)
- Freios: discos ventilados e perfurados (diant. e tras.)
- Direção: elétrica
- Rodas e pneus: 245/35 ZR 20 (diant.), 305/30 ZR 20 (tras.)
- Dimensões: comp., 452,8 cm; largura, 185,2 cm; altura, 128,4 cm; entre-eixos, 245 cm; peso, 1.470 kg; tanque, 64 l; porta-malas, 125 l
- Desempenho: 0 a 100 km/h em 3,7 s vel. máx., 310 km/h