Lamborghini Temerario é híbrido insano com V8 e 920 cv que substitui o Huracán
Lamborghini Temerario combina motor V8 biturbo e três elétricos para ser muito mais potente e, quem diria, mais controlável
De uma tradição a Lamborghini não abre mão: batizar seus carros com nomes de touros. O que dá nome ao mais novo supercarro de entrada da empresa é um touro famoso nas arenas da Espanha, no final do século 19: Temerario.
Outras tradições da marca italiana, que pertence ao Grupo VW, ficaram pelo caminho. Acostumada aos motores V12, neste lançamento a Lamborghini se rendeu à força de um V8 biturbo e a outros três motores elétricos para ficar ainda mais potente, rápido e, quem diria, mais dócil na pista.
O DNA permanece. Diretor de design da Lamborghini, o alemão Mitja Borkert, que foi responsável por recriar o Countach com base no Aventador, em 2021, conta que revisitou o supercarro fabricado entre 1974 e 1990 novamente ao deixar as bandas dos pneus traseiros visíveis através de recortes nos para-lamas traseiros.
As linhas das janelas laterais são outras características dos Lamborghini que nasceram no Countach e seguem vivas no Temerario – neste, com a tomada de ar à frente do para-lama traseiro, reinterpretada, mas não é só pelo estilo: o ar canalizado ali ajuda o motor a respirar e aumenta o downforce em 103% na comparação com o Huracán Evo.
O que mais chama a atenção, no entanto, são as luzes diurnas de led em formato de hexágono, formas bem distintas. Pela resposta de Mitja, seu objetivo foi alcançado: “É para que o Temerario seja facilmente identificado, da mesma forma que o “Y” de led facilita a identificação do Revuelto” – que é o supercarro V12 que está acima do novo esportivo, no plantel da marca.
A parte superior do hexágono é a seta do carro, e o miolo, um duto para o ar controlar a turbulência nas rodas dianteiras. O hexágono reaparece de propósito na traseira, na forma das lanternas e na área do escape.
O Lamborghini Temerario é 18 cm mais comprido que um Huracán, seu antecessor, com 4,70 m no total. Esse aumento garante mais espaço para os dois componentes mais importantes do carro: os ocupantes e a mecânica.

Assim como o Huracán, o Temerario também traz chassi de alumínio, mas com estrutura evoluída para obter 50% menos peças e 80% menos soldas quentes, o que aumenta sua rigidez torcional e reduz seu peso.
Os projetistas aproveitaram para ampliar o espaço do habitáculo, o que costuma ser assunto delicado quando se fala de superesportivos. Há cerca de 3 centímetros a mais na distância entre-eixos (agora de 2,66 m) que, quase na sua totalidade, foram convertidos em mais espaço para as pernas. A Lamborghini diz que este é o supercarro mais espaçoso do mundo.
O espaço é bom e é possível configurar um Temerario com o acabamento em padrão de carro de luxo, com bancos mais amplos e mimos como direção com ajuste elétrico. O sistema de som da Sonus Faber, fabricante italiano de equipamentos de alta fidelidade, é projetado para entregar qualidade com alto-falantes mais compactos. Para quem gosta de telas, há três: além dos instrumentos e da central, há um visor de 9” para o carona. E a cabine tem três câmeras 4K que podem gravar o motorista e enviar para as redes sociais com informações dos mostradores do carro.
Quem ficou com os outros 15 cm do ganho de dimensões foi a mecânica, que de tão diferente justificou uma longa explicação do diretor técnico da Lamborghini, Rouven Mohr. Primeiro para esclarecer que o V8 4.0 biturbo de 800 cv é completamente diferente daquele usado pelo Urus e pelos principais esportivos de Audi e Porsche.
Este novo motor foi concebido para entregar potência em alta rotação – são 800 cv entre 9.000 e 9.750 rpm com corte de giro a 10.000 rpm. Daí vem a utilização de liga de alumínio de carros de motores de competição, do virabrequim plano e de dois enormes turbocompressores com pressão de até 2,5 bar.
Em condições normais, o atraso na resposta dos turbos (o turbolag) acabaria com o desempenho do Temerario. Por isso existe um motor elétrico de 150 cv e 30,6 kgfm montado entre o V8 e seu câmbio de dupla embreagem de oito marchas. Este motor está sempre girando com o V8 em uma relação simbiótica, ou preenchendo suas lacunas de força ou recuperando a energia cinética. Ele, inclusive, pode recarregar a bateria em seis minutos utilizando o V8, no modo Recharge, enquanto na tomada levaria meia hora – a uma potência de 7 kW. Em vez de tempo, consome gasolina com a rotação mais alta em ponto morto.

A bateria, aliás, tem 3,8 kWh e permite que o Temerario rode quase 10 km em modo elétrico. Ela ocupa o túnel central, pois não há cardã passando ali. As rodas dianteiras são acionadas por dois motores elétricos, cada um com 82 cv constantes (mas com pico de até 295 cv), e são eles que movem o carro em modo elétrico.
Os Lamborghini de outros tempos e cultuados até hoje, como Miura, Countach e Diablo, eram exigentes. Sem assistência na direção e com embreagem pesada, pouca visibilidade e posição de dirigir desconfortável, eles realmente buscavam habilidade de piloto nos seus motoristas. Agora é o carro quem pensa pelo motorista, até porque os compradores de hoje têm outras expectativas ao volante.
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Você pode ter percebido que a soma da potência de todos os motores é 1.114 cv, enquanto a Lamborghini declara 920 cv. Esta é a potência máxima que chega às rodas, mas quem decide como isso é feito é o próprio carro. Depende das condições de temperatura, aderência, inclinação e, também, do modo de condução.
Por exemplo, em modo Corsa, o carro assume uma atitude mais neutra e equilibrada com mais atuação dos motores dianteiros. É neste modo que o Temerario é mais rápido no circuito. Quer se divertir? Ative o modo Sport no nível Performance (há, também, Hybrid e Recharge): a força será concentrada no eixo traseiro, deixando o carro vivo nas acelerações e bem mais arisco nas curvas. Ele entrega os mesmos 920 cv, mas de outra forma.
É uma lógica complexa, que depende de um sistema de vetorização de torque que aplica força dos motores elétricos nas rodas para controlar o carro, quando sistemas comuns atuam freando as rodas – o que o Temerario só faz em último caso. Para isso ser possível, porém, a Lamborghini precisou desenvolver seu próprio módulo de gerenciamento: as soluções prontas de fornecedores não teriam sido capazes de lidar com tantos sinais para controlar os quatro motores e tanta potência com a precisão que a Lamborghini buscava.
A precisão é tamanha que a Lamborghini se viu encorajada a oferecer um modo drift pela primeira vez. A eletrônica ajuda o motorista a controlar o sobresterço, desde o primeiro nível, com ângulo de escorregamento limitado, ao nível três, dedicado a motoristas que quiserem se aventurar com um escorregamento maior. Eu parei de acertar o drift neste terceiro nível e fiquei com a impressão de que o piloto de testes da Lamborghini, Nicolò Piancastelli, esperava mais de mim após um dia inteiro acelerando o Temerario comigo no Autódromo do Estoril, em Portugal.
Pude levar Temerario até o limite – o meu limite. O piloto ia no carro da frente ditando o ritmo e eu ia atrás, recebendo instruções via rádio para otimizar o traçado e os pontos de frenagem. Quanto mais eu o pressionava, mais ele acelerava. No final da primeira bateria, já estávamos andando forte, passando na reta a 300 km/h. A curva de aprendizagem escalou muito, muito rápido.
Nas baterias seguintes, os carros teriam o pacote Alleggerita, que adiciona uma asa traseira maior e elementos como saias laterais, tampa do motor e splitter dianteiro de fibra de carbono, e painéis inferiores de fibra de carbono reciclada, além dos vidros laterais mais leves e dos painéis de porta de fibra de carbono. É uma dieta que reduz o peso em 12,95 kg.
Se faz diferença? Com certeza. Mais pelo aumento de 67% na carga aerodinâmica, que fez o Temerario agarrar mais nas curvas de alta velocidade e ficar mais estável na reta. Foi aí que tomei coragem para superar os 300 km/h no final da reta e montar nos freios – carbono-cerâmicos, diga-se. A máxima declarada é de 343 km/h e pode chegar aos 100 km/h em 2,7 s.
O que é legal no Temerario é abusar das rotações do motor V8 usando as trocas manuais. Deixar o conta-giros correr nas acelerações, reduzir marcha a 7.000 rpm, porque ele foi feito para isso. Se o V8 gosta de trabalhar cheio, os motores elétricos dão uma assistência providencial para que a entrega de força seja quase tão linear quanto a de um motor aspirado. Ou até melhor.

Eu fiquei realmente à vontade acelerando na pista, peguei confiança no carro, uma sensação que não senti da mesma forma quando tive a oportunidade de pilotar o Huracán Tecnica. Na verdade, naquela ocasião, quando senti muita confiança, eu fiz o carro rodar. Com o Temerario, a sensação que ficou foi a de que eu consegui domar o touro. Ou que este animal eletromecânico se esforçou para me deixar mais satisfeito do que ameaçado.
O esforço para explorar as sensações é tamanho que houve um empenho da engenharia para fazer as vibrações naturais do V8 de virabrequim plano reverberarem pela estrutura de alumínio do carro para que o motorista as sinta em alta velocidade, da mesma forma que o timbre do motor muda com o modo de condução. E ainda tem um atuador na cabine para reforçar alguma frequência que o V10 do Huracán alcançava.
O Temerario custa a partir de 315.250 euros na Itália e o pacote Alleggerita custa mais 42.700 euros. E ainda dá para reduzir mais 12 kg com rodas de fibra de carbono, que custam mais 24.400 euros – no total, 385.350 euros ou R$ 2,4 milhões, sem os impostos que mais que dobram este valor. Os primeiros carros devem chegar ao Brasil em 2026 e este é apenas o começo: o Temerario ainda terá pelo menos mais dez anos de evolução pela frente, mas sobre isso ninguém da Lamborghini quis contar detalhes.
Veredicto Quatro Rodas
O Lamborghini Temerario é muito mais potente que o Huracán e muito mais domável também.
Ficha Técnica – Lamborghini Temerario
Preço: 315.250 euros (Itália)
Motor: dois elétricos, diant., 295 cv a 3.500 rpm; um gas. central, V8, 3.995 cm³, biturbo, 800 cv entre 9.000 e 9.750 rpm, 74,4 kgfm entre 4.000 e 7.000 rpm; elétrico tras., 150 cv e 30,6 kgfm; total de 920 cv
Bateria: íons de lítio, 3,8 kWh; pot. recarga AC, 7 kW
Câmbio: dupla embreagem, 8 m., tração integral
Direção: elétrica
Suspensão: duplo A (diant. e tras.) com amort. magnetorreativos
Freios: disco ventilado perfurado e cabono-cerâmicos (diant. e tras.)
Pneus: 255/35 R20 (diant.) e 325/30 R21 (tras.)
Dimensões: comprimento, 470,6 cm; largura, 224,6 cm; altura, 120,1 cm; entre-eixos, 265,8 cm; peso (seco), 1.690 kg; porta-malas, 112 litros
Desempenho*: 0 a 100 km/h, 2,7 s; veloc. máx., 343 km/h
*Dados de fábrica








