Longa Duração: o desmonte do Jeep Renegade
Nas vendas, o Renegade não sai do vácuo do HR-V. Mas aqui a missão é outra: mostrar que tem mais robustez e uma rede ainda melhor que a do rival
Difícil a situação do Jeep Renegade no Longa Duração. Além dos desafios impostos pelos 60.000 km, o Jeep teve que encarar um agravante: ser o primeiro carro da frota desmontado após a despedida do Honda HR-V, justamente seu arquirrival entre os SUVs compactos.
Acontece que o modelo japonês foi embora e deixou saudade: estava em estado de zero-quilômetro, íntegro, apenas com alguns itens da suspensão dianteira como alvo de leve crítica.
Essa proximidade dos desmontes fez a dúvida se instalar: conseguiria o primeiro Jeep analisado no Longa Duração sair de cena tão elogiado quanto seu adversário?
Entre membros da redação e colaboradores, 24 pessoas se revezaram ao volante do Renegade. E desde os primeiros relatos, alguns pontos ficaram muito claros.
Os positivos mais destacados: cabine completa, com multimídia, GPS, borboletas de câmbio no volante e caprichos como tapetinhos de borracha nos porta-objetos e painel agradável ao toque e de baixo brilho, não refletivo.
Entre as reclamações, três unanimidades: desempenho fraco, consumo elevado e porta-malas minúsculo.
Ao nosso lado, o Renegade se comportou bem, mas deu suas deslizadas. Aos 9.000 km, o alarme passou a disparar inadvertidamente.
Na rede Jeep, recebeu uma atualização eletrônica que sanou o problema. Na segunda revisão, outra atualização de software foi feita para atenuar o volume dos bipes de confirmação, irritantemente altos.
O miolo da ignição, que por vezes retinha a chave após o desligamento do motor, também precisou de duas intervenções da rede autorizada, na metade e no fim da jornada.
E ainda passamos por um recall: nova atualização de software, desta vez para impedir o desligamento do motor ao se utilizar o piloto automático – tal problema nunca se manifestou com a gente.
Se colar, colou
Com paradas previstas a cada 12.000 km, fizemos quatro revisões, todas em São Paulo. Decepção em duas delas: na Europamotors (primeira revisão) e na Autostar (quarta), houve tentativa de cobrar um valor bem maior do que o sugerido no site da Jeep.
Apesar de poderem desrespeitar a sugestão de preços da fábrica, as concessionárias, em geral, seguem o valor à risca. Tanto que, em ambos os casos, voltaram atrás assim que, como consumidores comuns, perguntamos o motivo da cobrança maior do que há no site da Jeep.
Na Autostar ainda pagamos R$ 361 pelos serviços de alinhamento e balanceamento, um dos valores mais altos já cobrados na história do Longa Duração. Na média, com o HR-V, tivemos um gasto 13,1% menor com os mesmos serviços.
O desmonte
Após uma inspeção visual da carroceria, nosso consultor técnico, Fabio Fukuda, saiu para um test-drive. “Motor já aquecido, últimas impressões anotadas.
Vamos aferir a pressão, levar para o centro cirúrgico e abrir o paciente”, disse Fukuda, já pegando alguns manômetros e encaminhando o SUV para o elevador.
https://www.youtube.com/watch?v=2uEQuZnhlQM
Pressão de óleo em marcha lenta, 1,0 bar – exatamente a mínima tolerada pela Jeep. A 4.500 rpm, situação um pouco melhor: aferida 4,3 bar, mínima admitida, 4,0 bar. Na linha de combustível, tudo certo: aferição de 4,5 bar, ante 4,2 bar admitido.
No exame de pressão de compressão dos cilindros, a Jeep não forneceu o valor mínimo, apenas o nominal, que se refere a um motor novo.
Por padrão, são feitas três medições em cada cilindro. Média de 16,32, 16,32, 16,78 e 16,09 bar, respectivamente nos cilindros 1, 2, 3 e 4.
Mais tarde, o desmonte do motor explicou não só os bons números de pressão de compressão, mas também a melhora dos números de desempenho e consumo entre o primeiro e o segundo testes (veja quadro comparativo mais abaixo).
Com os principais itens internos do cabeçote (válvulas de admissão e escape) e do bloco (pistões, bielas e virabrequim) aprovados tanto na inspeção visual como nas análises dimensionais, tudo estava bem com o motor 1.8, herdado da Fiat, com seu bloco de ferro fundido: “A robustez dos elementos internos está comprovada. O problema é o seu elevado peso. Aliás, faz tempo que não vejo um bloco tão pesado”, diz Fukuda.
O sobrepeso atinge outras partes. Reforços estruturais permitem o acoplamento do motor, mas tornam a dianteira do Jeep ainda mais pesada.
“Não por acaso, encontramos os coxins dos dois amortecedores dianteiros danificados, especialmente o do lado direito. Com folga axial, ele permitia uma variação excessiva da geometria da suspensão nas arrancadas. Isso explica o volante puxando para a direita, tendência notada durante a tomada de impressões finais”, diz Fukuda.
Robusto por dentro, por fora o motor vazava óleo: “Falência do retentor da polia”, disse. Havia um outro vazamento, na colmeia do radiador. “Os dois são pequenos, mas inadmissíveis. Hoje em dia, quase não se vê mais esse tipo de problema.”
Pastilhas de freio dianteiras chegaram aos 60.000 km com espessura abaixo do mínimo aceito. Os pneus foram vítimas de um serviço ruim de alinhamento, balanceamento e rodízio.
Efetuados em todas as revisões, não impediram que todos chegassem ao fim do teste com desgaste mais acentuado na borda interna da banda de rodagem.
Quer mais? No desmonte, descobrimos que uma das concessionárias que atenderam nosso Renegade calçou um dos coxins da linha de escapamento. “Em vez de reposicionar o suporte ou mesmo sugerir a troca, optaram por uma gambiarra”, diz Fukuda.
Câmbio, carroceria, acabamento e sistema elétrico foram bem ao longo do teste e no desmonte final. Merecem elogios, mas não isentam o Renegade da necessidade de melhora urgente, com um motor mais moderno – que por sinal acaba de ser atualizado – e uma rede mais Jeep e menos Fiat. Por ora, o Renegade sai aprovado, mas com pesadas ressalvas.
Peças aprovadas
Peso-pesado
Mesmo sendo o provável algoz dos amortecedores dianteiros, o pesado bloco de ferro fundido foi bem, assim como os componentes que nele vão: pistões, bielas e virabrequim chegaram aos 60.000 km em perfeito estado de conservação e com todas as medidas dentro da faixa de tolerância da Jeep.
Sistema digestivo
Os conjuntos de admissão e ignição estão de parabéns: no desmonte, todos os seus principais componentes (bicos injetores, corpo de borboleta e velas) foram encontrados com grau de impregnação compatível com a alta quilometragem.
Tudo em cima
No cabeçote, tudo na mais perfeita ordem, com válvulas de admissão com acúmulo de carvão moderado, adequado à quilometragem – as de escape estavam bem limpas.
DNA blindado
No que diz respeito ao isolamento da carroceria, o Renegade é um legítimo Jeep. Mesmo com alguns passeios em estradas de terra (molhadas e poeirentas), não vimos sinal de invasão de água ou pó, comprovando a eficácia da vedação das portas.
Alimentação e ignição
Substituído a cada 12.000 km, ou seja, durante as revisões programadas, o filtro de ar do motor foi encontrado relativamente limpo, indicando que o intervalo de troca é adequado.
Tudo em seu lugar
Justiça seja feita: para um veículo que utiliza o motor com um pesado bloco de ferro, os coxins cumpriram muito bem o seu papel. Sem sinal algum de ruptura nem ruídos ao longo do teste, os três coxins (do motor, do câmbio e torcional) foram encontrados em bom estado de conservação.
Peças que demandam atenção
Troca na suspensão
Assim como o Honda HR-V, as bieletas do Renegade foram fonte de ruídos na suspensão dianteira ao longo dos 60.000 km. Reapertadas na primeira, terceira e quarta revisões, chegou a ser substituída na segunda, em garantia.
Lamela de freio
Deslize da rede que poderia ter comprometido a segurança: no desmonte, encontramos as quatro pastilhas dianteiras com espessura abaixo (na média, 3,85 mm) do mínimo recomendado pela fábrica (4 mm). Na traseira, tudo certo: em média, 9,03 mm de espessura – distante, portanto, dos mesmos 4 mm tolerados.
Gambiarra
Em alguma das visitas à rede Jeep, calçaram um dos coxins da linha de escapamento com um pedaço de outro coxim. Típico reparo que se espera ver em qualquer lugar, menos dentro de uma concessionária autorizada.
Peças reprovadas
Colmeia
Fato inédito no Longa Duração, radiador chegou aos 60.000 km com vazamento no canto superior direito. Ainda discreto, não deixava sequer acúmulo de água no chão, ao estacionar. Com o tempo, a tendência era o agravamento do problema.
Rangido nas curvas
Rompido, o coxim do amortecedor dianteiro direito rangia quando o SUV era movimentado com o volante esterçado. Ainda que em nível menos grave, o lado esquerdo apresentou o mesmo problema. Os demais itens da suspensão estavam bons.
Veredicto QUATRO RODAS
Mais do que a inferioridade (em termos de robustez) diante do HR-V, o Renegade se despede deixando claro que a marca Jeep precisa cuidar do produto (modernizando-o) e da rede.
Esta, em grande parte oriunda de tradicionais concessionárias Fiat. Jeitinho na manutenção e tentativa de cobrança de valores mais altos do que o justo destoam da imagem de excelência que o nome Jeep(ainda) tem entre os brasileiros.
FOLHA CORRIDA
Tabela de preços
- Em junho de 2015: R$ 80.900
- Atual (modelo usado): R$ 80.522
- Atual (modelo novo): R$ 90.490
Quilometragem
- Urbana: 17.925 km (29,8%)
- Rodoviária: 42.340 km (70,2%)
- Total: 60.292 km
Combustível (etanol)
- Em litros: 8.630,84
- Em reais: R$ 21.363,33
- Consumo médio: 7 km/l
Manutenção (revisão / alinhamento)
- 12.000 km – Europamotors: R$ 327 / R$ 250
- 24.000 km – Sinal: R$ 723 / R$ 240
- 36.000 km – Caltabiano: R$ 810 / R$ 260
- 48.000 km – Autostar: R$ 693 / R$ 361
Extras
- Grade frontal: R$ 120
- Franquia de vidro (troca do para-brisa): R$ 110
Custo por 1.000 km
- Combustível: R$ 354,33
- Revisões: R$ 42.34
- Alinhamento: R$ 18,43
- Extras: R$ 3,81
- Total: R$ 418,92
Ocorrências
- 3.062 km: ruído na suspensão dianteira
- 3.236 km: travamento da chave no miolo da ignição
- 9.366 km: disparo do alarme ao travar as portas
- 28.625 km: ruído de vibração no escapamento
- 20.351 km: travamento da chave no miolo da ignição
- 44.992 km: perda da grade do para-choque dianteiro
- 50.313 km: pedra atinge e trinca o para-brisa
- 58.245 km: ventilador do ar-condicionado fraco
- 58.812 km: suspensão dianteira ruidosa
Testes de pista (com etanol)
1.000 km | 60.001 km | Diferença | |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 13,7 s | 13,5 s | 1,46% |
Aceleração de 0 a 1.000 m | 34,9 s / 150 km/h | 34,7 s / 151,3 km/h | 0,57% / 0,87% |
Retomada de 40 a 80 km/h (em D) | 6,2 s | 6,0 s | 3,23% |
Retomada de 60 a 100 km/h (em D) | 7,7 s | 7,6 s | 1,3% |
Retomada de 80 a 120 km/h (em D) | 10,8 s | 10,1 s | 6,48% |
Frenagens de 60 / 80 / 120 km/h a 0 | 17,6 / 31,3 / 71,2 m | 17,4 / 30,2 / 67,2 m | 1,14% / 2,89% / 5,62% |
Consumo urbano | 6,9 km/l | 7,9 km/l | 14,49% |
Consumo rodoviário | 8,1 km/l | 9,8 km/l | 20,99% |
Ruído interno PM / RPM máximo | 44,7 / 69,2 dBA | 42,2 / 70,1 dBA | 5,59% / 1,3% |
Ruído interno a 80 / 120 km/h | 59,7 / 67,4 dBA | 61,9 / 67,7 dBA | 3,69% / 0,45% |
Ficha Técnica – Jeep Renegade Longitude 1.8 flex AT
Motor | flex, dianteiro, transversal, 4 cil., 1.747 cm³, 16V, 80,5 x 85,6 mm, 12,5:1, 132/130 cv a 5.250 rpm, 19,1/18,6 mkgf a 3.750 rpm |
Câmbio | automático, 6 marchas, tração dianteira |
Direção | elétrica, 10,8 m (diâmetro de giro) |
Suspensão | independente, McPherson (diant.), independente, McPherson (tras.) |
Freios | disco vent. (diant.), disco sólido (tras.) |
Pneus | 225/55 R18 |
Peso | 1.440 kg |
Peso/potência | 10,9/11,1 kg/cv |
Peso/torque | 75,4/77,4 kg/mkgf |
Dimensões | comprimento, 423,3 cm; largura, 179,8 cm; altura, 168,8 cm; entre-eixos, 257 cm; porta-malas, 273 l; tanque de combustível, 60 litros |
Equipamentos de série | ar-condicionado digital, direção elétrica, trio elétrico, multimídia, volante multifuncional com borboletas do câmbio, controle de estabilidade e tração, câmera de ré. |