Por muito pouco o Porsche 911 não nasceu com motor central, como manda a cartilha da melhor distribuição de peso em um automóvel, em vez de traseiro.
O 911 é inspirado no 356, considerado o primeiro carro produzido pela Porsche.
Seu primeiro protótipo tinha motor central, mas, como reduzir custos era importante na Alemanha pós-guerra, os projetos seguintes já usavam chassi parecido com o do Fusca, com motor pendurado na traseira. E assim foi feito. A fórmula segue viva até hoje no Porsche 911, já na nona geração.
A Porsche não chegou a desistir do motor central. Ele retornaria em 1953 com o 550 Spyder, que só teve 90 unidades fabricadas. Depois, mais de uma dezena de modelos de corrida aproveitariam o motor instalado estrategicamente no meio do veículo.
Mas apenas o 914, o carro verde da foto, e o Boxster, azul, tornariam popular essa configuração mecânica tão divertida. Por isso eles estão aqui.
O 718 Boxster GTS é o mais rápido da sua linhagem – pelo menos enquanto a nova versão Spyder não é apresentada. Ao trocar o motor 3.4 aspirado de seis cilindros pelo 2.5
turbo de quatro cilindros, ele ganhou 35 cv, chegando aos 365 cv.
Frente ao Boxster S, tem 15 cv a mais, além de para-choques diferentes e rodas aro 20. Os elementos em preto brilhante são opcionais: R$ 2.000 para o spoiler, R$ 2.931 para as barras anticapotagem e R$ 826 para os logotipos.
O emblema na traseira do 914 também chama atenção. Não por ser dourado, mas por ter o logotipo da Volkswagen unido ao da Porsche.
Como a Porsche devia um projeto à Volks desde os anos 40, desenvolveu o 914 para substituir ao mesmo tempo o Karmann-Ghia e o 912 – um 911 com motor 2.0 de quatro cilindros.
Se o 914/4 (1.7 quatro cilindros de 80 cv) não emocionava muito, o 914/6 (2.0 seis cilindros de 110 cv) já fazia uma graça com seus parcos 940 kg, mas respondeu por apenas 3.332 dos 118.980 produzidos.
Pouquíssimos 914/6 vieram para o Brasil. O exemplar das fotos pertence ao advogado Sergio Magalhães, maior colecionador de Porsche da América Latina.
Foi ele quem providenciou o sistema de freios a vácuo do 911 Turbo (930) e a troca do motor original pelo do 911 Carrera RS 1973/74, um 2.7 com injeção mecânica Bosch de 210 cv. Ficou bem arisco, principalmente por manter o câmbio manual de cinco marchas original.
Ao volante, Magalhães mostra que não é difícil fazer as rodas traseiras destracionarem mesmo em terceira marcha. Ele diz alguma coisa sobre a sensibilidade da embreagem, mas não ouço bem: o seis cilindros refrigerado a ar roncando atrás de mim não permite.
No Boxster eu também me sento rente ao chão, o acelerador é preso ao assoalho e o volante está quase na vertical. Mas é tão sofisticado que posso escolher quando e quais dos meus sentidos serão incomodados. Um botão no console aciona um flap no escape só para deixar o ronco mais encorpado.
Outro comanda a suspensão ativa, que torna o GTS ainda mais firme e até 1 cm mais próximo do asfalto. Nos modos de condução Sport e Sport Plus, que seleciono em um comando giratório no volante, a suspensão passa a trabalhar com o controle dinâmico de chassi, limitando a inclinação da carroceria nas curvas.
Até os coxins do motor se comportam diferente! Ativos, passam a transmitir mais vibração do motor conforme a rotação aumenta ou quando o modo Sport Plus está selecionado.
É bom que o 2.5 turbo se faça sentir, pois não pode ser visto. Se o motor do 914 fica por baixo de uma grade rente ao vidro traseiro, no 718 o quatro cilindros fica escondido entre o bagageiro de trás e o compartimento que acomoda o teto retrátil de tecido.
Embora tenha variação apenas para as válvulas de admissão, este 2.5 tem turbo de geometria variável, comum em motores diesel, mas raro para os a gasolina. Ele ajusta as pás da carcaça do turbo para entregar máxima eficiência independentemente do fluxo dos gases de escape.
O resultado é o torque imediato, sem nenhum atraso de resposta, facilitando a vida do câmbio PDK, de dupla embreagem e sete marchas, extremamente preciso. Quer mais fôlego? Aperte o botão Sport Response no volante e o turbo será levado à pressão máxima de trabalho (1,3 bar) por 20 segundos.
Testamos toda a parafernália eletrônica do 718 Boxster GTS no Autódromo de Interlagos. Mesmo no trecho mais sinuoso, entre a curva da ferradura e o mergulho, é difícil encontrar o limite do roadster. Quando aparece, é acompanhado de uma leve escapada de traseira, graças ao diferencial de deslizamento limitado.
Na reta, olho para o velocímetro antes de frear para entrar no S do Senna e vejo algo acima dos 210 km/h. Provável: em nosso teste (na pista de Limeira), foi de 0 a 100 km/h em 4,1 s e alcançou 238,2 km/h nos 1.000 metros. Mas ele bebe bem: 8,7 km/l na cidade.
Pelo preço de R$ 480.000 – ou R$ 552.000 como o testado, com opcionais como faróis de led (R$ 3.932), acabamento Alcantara no interior (R$ 10.173) e sensores de estacionamento e câmera de ré (R$ 3.793) –, o 718 Boxster GTS é bem interessante.
Se os alemães tivessem considerado a relação entre custo e diversão 70 anos atrás, provavelmente o 911 atual teria motor central e os Boxster e o 914 não existiriam. Seria uma pena. Tomaram a decisão certa.
Veredicto
O 718 Boxster GTS não dá sensações tão puras como o 914, mas se esforça. Para os padrões atuais, o novato impressiona.
Ficha técnica – VW-Porsche 914/6 1971
- Motor: gas., central, longit., 6 cil., 12V, aspirado, 2.687 cm3, 210 cv de 6.300 rpm, 26 mkgf de 5.100 (o motor é do 911 Carrera RS 1973)
- Câmbio: manual, 5 marchas, tração traseira
- Suspensão: McPherson (diant.) / braços arrastados (tras.)
- Freios: disco vent. nas quatro rodas
- Direção: mecânica
- Dimensões: compr., 398,5 cm; largura, 165 cm; alt., 122 cm; entre-eixos, 245 cm; peso, 940 kg; tanque, 61,8
Ficha técnica – Porsche 718 Boxter GTS
- Preço: R$ 552.000
- Motor: gasolina, central, longitidunal, 4 cilindros, boxer, 16V, turbo, 2.497 cm³, 365 cv de 6.700 rpm, 43,8 mkgf de 1.900 a 5.000 rpm
- Câmbio: automatizado, dupla embreagem, 7 marchas, tração traseira
- Suspensão: McPherson (dianteira e traseira)
- Freios: disco ventilado nas quatro rodas
- Direção: elétrica
- Pneus: 235/35 R20 (dianteira) e 265/35 R20 (traseira)
- Dimensões: comprimento, 440,4 cm; largura, 180,1 cm; altura, 127,3 cm; entre-eixos, 247,5 cm; peso, 1.405 kg; tanque, 64l; porta-malas, dianteiro 150 l, traseiro 125 l
Teste – Porsche 718 Boxter GTS
- Aceleração 0 a 100 km/h: 4,1 s
- Aceleração 0 a 1.000 m: 22,2 s – 238,3 km/h
- Velocidade máxima: 290 km/h (Dado de fábrica)
- Retomada de 40 a 80 km/h: 1,9 s
- Retomada de 60 a 100 km/h: 2,4 s
- Retomada de 80 a 120 km/h: 2,6 s
- Frenagens 60/80/120 km/h – 0 m: 15,1/24,3/53,9 m
- Consumo Urbano: 8,7 km/l
- Consumo Rodoviário: 13,5 km/l