Porque os outros carros elétricos desvalorizaram mais que o BYD Dolphin?
Para especialista, preços de lançamento fora da realidade e desconfiança do público são fatores que favorecem a desvalorização dos elétricos usados
As vendas de carros elétricos em 2024 já supera as de 2023. Levando em consideração todos os tipos de eletrificação, 109.283 unidades foram emplacadas entre janeiro e agosto deste ano, número que supera o total vendido em todo o ano passado, segundo dados da ABVE.
O número de carros novos é maior, mas os elétricos e híbridos estão começando a chegar ao mercado de usados e muito se fala sobre a desvalorização destes modelos.
Os números não mentem: quem comprou um Renault Kwid e-Tech em 2022, no ano de seu lançamento, pagou o equivalente a R$ 142.990. Hoje, com dois anos de uso, o preço indicado pela Tabela Fipe na troca por um carro novo é de R$ 79.700, uma desvalorização de 44,3% frente ao valor de lançamento. Mas nas lojas é possível encontrá-lo por até R$ 97.670, um valor muito próximo aos R$ 99.990 cobrados pela Renault por um 0 km.
Essa queda repentina no preço de muitos elétricos tem um nome: BYD Dolphin. O compacto chegou ao Brasil em 2023 entregando mais conteúdo pelo mesmo valor dos três elétricos mais baratos do país na época (Kwid, Caoa Chery iCar e JAC E-JS1).
J.R Caporal, presidente da Auto Avaliar, plataforma de avaliação de veículos usados, faz um apontamento sobre esse fenômeno: “O que desvalorizou o carro elétrico usado foi o 0 km”.
O executivo chama a atenção para o alto valor cobrado por esses carros na época e diz ser difícil falar sobre desvalorização em um segmento ainda tão novo. O caso que aconteceu com a “trindade” dos elétricos mais baratos do Brasil também pode ser vista em outros modelos mais caros.
Veja o Peugeot e-2008, por exemplo. Em 2022 ele estreou custando R$ 259.990, um preço mais em conta se comparado aos rivais como Chevrolet Bolt e Volvo XC40, mas nunca foi um grande destaque nas vendas, tendo apenas 75 emplacamentos em 2023, segundo a Fenabrave. Para queimar estoque — afinal, foi reestilizado — e alavancar as vendas, seu preço caiu para R$ 159.990 e entre março e abril deste ano 400 unidades foram vendidas. Na troca por um novo, o SUV tem preço de R$ 140.600 na tabela Fipe.
Caporal explica isso como o amadurecimento de um mercado em formação. Segundo ele, há poucos carros elétricos em circulação e, em sua maioria, sofrem por terem sido lançados por valores altos demais, afinal, o contexto da época era diferente. “Ainda não existem bases estatísticas para o mercado se auto-regular”, explica.
O BYD Dolphin é a prova desse amadurecimento. Ele chegou custando R$ 149.800, praticamente o mesmo que os elétricos mais baratos da época. Logo, não só a Renault como também JAC e Caoa Chery correram para abaixar o preço dos seus carros, ou sairiam perdendo nessa queda braço. Assim, esses três modelos chegaram ao patamar que estão agora, custando abaixo dos R$ 100.000.
Porém, a estratégia de lançá-los por um valor mais alto teve um custo. Hoje, o trio sofre com a desvalorização acima dos 40% em menos de três anos de mercado — 42,9% para o iCar, 44,3% para o Kwid e 46% para o EJS-1. O Dolphin, por outro lado, registra uma desvalorização de apenas 9,63% e um usado custa em média R$ 135.462, segundo levantamento da Mobiauto.
Ao contrário dos rivais, o BYD Dolphin nunca teve seu preço de tabela reduzido. Houve, sim, a oferta de benefícios como seguro, carregador e revisões gratuitas, alguns bônus definidos na mesa do vendedor, mas nada de redução de preço. Na verdade, após um ano de mercado, teve seu preço de lançamento reajustado para R$ 159.800 nas unidades 2025. E só.
Mas além dos preços, Caporal também fala sobre as novas montadoras que estão chegando no Brasil para explorar o segmento dos elétricos: “Quem são essas marcas? São de confiança? Teremos peças de reposição?”, questiona. Segundo ele, a chegada de marcas desconhecidas gera receio no público e essa incerteza de continuidade e fidelização de um trabalho são fatores que também poderão contribuir para uma futura desvalorização.
Nessa questão, mais uma vez, a BYD sai na frente. A montadora está lançando um programa de recompra que garante pagar até 80% da FIPE. O especialista vê a proposta como uma boa iniciativa e considera um primeiro passo para o novo segmento que está surgindo: “É uma estratégia que funciona e já funcionou em outros casos”.